|
Chico Buarque lança novo
romance: "Essa Gente"
Por
Harold Emert
11/12/2019
Estes são realmente tempos difíceis, não apenas para o Brasil e os brasileiros,
mas também para os cidadãos de Trumpsville e outras partes do mundo.
E o escritor Chico Buarque, vencedor de um Prêmio Camões (o Nobel de
literatura em língua portuguesa), em seu último romance "Essa Gente", captura o
espírito conturbado da reação de um artista-intelectual e da sua luta pela
sobrevivência financeira e espiritual em meio aos eventos bizarros que
temos vivido ultimamente aqui.
Em uma terra anteriormente conhecida por sua cordialidade e pela música alegre, a
vida no Brasil tornou-se uma guerra verbal entre "esquerda" e "direita" e um
cruzamento entre o universo confuso e trágico-absurdo de Fellini e Kafka.
A culpa é de um ex-capitão do exército chamado “Mito” (que alguns chamam de “Bozo”),
seus três filhos sinceros e seguidores cegos de um filósofo brasileiro de
direita - antes desconhecido - assumindo as rédeas do poder.
O novo romance de Chico é um fascinante diário fictício (?) de um escritor
brasileiro chamado Duarte que - assim como o compositor, violonista, cantor e
romancista Chico Buarque - reside em um bairro de classe alta do Rio - o
Leblon - não muito longe de esposas e filho.
Além disso, cenas aterrorizantes, que constantemente entram no romance, refletem
aqueles eventos e notícias sobre os quais experimentamos, lemos impressos ou
online, testemunhamos ou assistimos recentemente na TV brasileira. Com outros
nomes e ruas, "Essa Gente" poderia facilmente acontecer em Manhattan, Paris (onde Chico é dono de um apartamento), Londres, Istambul etc, e
o autor poderia ser um clone do falecido ganhador do Nobel americano Philip Roth.
Essas cenas assustadoras incluem: uma multidão aplaudindo descontroladamente,
como em um evento esportivo, quando um bandido é baleado a sangue frio
por um atirador da polícia; um rico carioca batendo em um mendigo
inocente; uma criança sendo intimidada na escola como "o filho de um comunista";
e esnobes inebriados em um clube carioca elitista tentando se isolar do mundo
real, muitas vezes violento, do Rio de Janeiro.
(Em referência ao tiroteio do bandido: Você se lembra do sequestrador do ônibus na
ponte de Niterói, morto por atiradores da polícia, quando o governador Witzel
saltou de um helicóptero comemorando com o polegar para cima?)
Antes de ler "Essa Gente", este colunista não era particularmente fã de Chico
(a quem alguns chamam de "comunista de champanhe"). Mas quando Chico recebeu o
prêmio Camões (que Presidente Bolsonaro se recusa a assinar), de repente me vi
querendo saber o que a resposta mais próxima do Brasil a Bob Dylan tem a dizer.
E não importa se um leitor concorda com as crenças políticas de Chico, que
continua sendo um fervoroso defensor do ex-presidente Lula. Ele realmente é
sensível a todos os acontecimentos estúpidos e sem sentido, que atormentam o
Brasil desde que o "Mito" foi eleito por uma margem de 10% de vitória para se
tornar o 36º Presidente do país.
Antes de ler "Essa Gente", apreciei o filme feito do romance de Chico
-
"Budapeste" - devido à sua ênfase no dilema humano - e não apenas no brasileiro -
de tentar fugir da rotina geralmente monótona da vida. Como muitos brasileiros
fogem de sua terra natal em busca de uma vida "melhor", esse romance "Budapeste"
se torna ainda mais relevante.
A peça de Chico "Gota d 'Agua" que eu vi recentemente no Teatro Ginástico,
no Rio,
foi particularmente impressionante como uma reflexão sobre a sociedade onde
políticos preferem usar o dinheiro dos contribuintes para manter suas campanhas
insanas do que destiná-lo para
hospitais, universidades, escolas e bibliotecas tão necessários.
E, à medida que o capitalismo selvagem esmaga os valores humanos com a cultura
importada de fast food que domina o Brasil, o escritor Duarte tenta terminar
seus romances. Ele é chamado de "estranho e anti-social" por seus vizinhos que
eventualmente expulsam o escritor por não pagar seu IPTU (que
enche o bolso de políticos corruptos).
Então, senhoras e senhores, por favor tirem o chapéu para esse gênio brasileiro: Chico Buarque, que
admite, apesar de todos os erros, injustiças e ineficiências do Brasil, ele
não consegue se ver morando em outro lugar!
E, por favor, Chico, apesar dos eventos atuais, incluindo: um administrador recém-nomeado
para a Funarte que culpa os Beatles pela disseminação do comunismo, e
o presidente de uma fundação de
defesa da cultura afro-brasileira dizendo
que o amado
sambista Martinho da Vila deveria ser "mandado para o Congo", ou o filho do Presidente da
República pedindo um retorno da tortura, da censura e da prisão,
ou um ministro da Educação que alega que as universidades brasileiras cultivam
maconha...por favor Chico, não termine sua vida como o seu principal personagem, o
romancista Duarte.
Nós precisamos de você!
|
SOBRE O COLUNISTA
Harold
Emert é um músico americano
que reside no Brasil desde
os anos 70, sendo
considerado um dos mais
importantes oboístas do
país, tendo trabalhado mais
de 20 anos na Orquestra
Sinfônica Brasileira com o
maestro Isaac
Karabtschevisky. |
Como
jornalista, escreve para sua coluna "Um Americano no
Rio" que é publicada em português e inglês, no
Brasil e exterior.
Para contato com o colunista,
clique aqui
Compartilhe:
|